sábado, 18 de fevereiro de 2012

A visita

Foi num dia de verão quando meu pai resolveu convidar o senhor  Cesar Cerqueira para jantar na nossa casa. O senhor Cesar Cerqueira era o chefe do meu pai que por coincidência nascera na mesma cidade que este e por isso tinham muitas coisas em comum para conversarem. Foi também por pura coincidência que ambos ficaram sabendo da tal da coincidência, pois numa discussão com um revendedor, disseram os dois ao mesmo tempo: _Pra mó de que moço vai lamber porco!... Ambos se entreolharam e riram também ao mesmo tempo, assim sendo, conversa vai e conversa vem, descobriram os dois serem ordinários de São Jose do Rio Preto. O relacionamento não poderia ir melhor do que estava sendo até então,  se tornaram amigos, independente do nível hierárquico que os distinguia. Claro que havia exceções, por exemplo, meu pai  jamais fora convidado pelo senhor Cerqueira para passar um fim de semana em sua casa de campo, ou andar em seu Iate, ou receber como bônus um ticket de avião para a Bahia ou outra como o senhor Juvenal dos Santos, o homem que fechara mais de 228 contratos em três meses recebera.  Não, não, eles eram amigos, nasceram na mesma cidade, mas o Senhor Cerqueira sabia muito bem o que os distinguia um do outro.  Demorou um bocadinho para que o Sr. Cerqueira em fim aceitasse o convite de meu pai . Quando viu que não tinha mais desculpas, que já matara quase toda a família , acabou marcando o tal do compromisso.
Minha mãe se empetecou toda, parecia arvore de natal e meu pai comprou o perfume mais caro que tinha e se banhou todo com o mesmo.  A mesa de jantar fora decorada a pronto e os talheres de prata, minha mãe os emprestou de minha tia que pediu pelo amor de Deus que os devolvesse completo.  Os copos foram polidos, os guardanapos eram de pano e a toalha alva sem manchas como eram de costume ter em casa, fora colocada sobre a mesa. Os pratos também foram emprestados, não pela minha tia, mas da vizinha que adorava a gente ( eu nunca entendi porque a vizinha gostava tanto assim da gente, o que sei é que ela sempre sorria para o meu pai quando esse chegava do trabalho e ao estacionar o carro a mesma estava exatamente do lado de fora regando o jardim. Até mesmo no outono, onde quase não haviam flores para serem regadas, lá estava a D. Veridiana regando o matinho.
Meu pai então se chegara para mim e dissera:
- Ernestinho meu filho amado, preciso de tua ajuda!
- Minha ajuda?  - perguntei eu meio desconfiado, pois a última vez que me pai me pediu ajuda foi para  ficar falando com a minha mãe enquanto ele se comunicava com alguns convidados para uma festa surpresa que ele queria fazer para ela. No final da conversa que eu começara com minha mãe, estava ela decidida que eu precisava urgente ir para um terapeuta.
-Ernestinho meu filho, você já esta quase um homem. Treze anos de idade! Ah, quando eu me lembro dos meus treze anos de idade...
- Ok, papai! – (Pensei comigo mesmo, caso o senhor se lembre dos seus 13 anos de idade, tenho certeza que metade o senhor vai inventar e a outra o senhor pensa ter vivido.)
- Eu era um garoto assim como você, bonito, inteligente, responsável e sabia exatamente o que queria para o futuro e...
- Ah é? – perguntei eu inocentemente – E o que foi que aconteceu que tudo mudou?
- Hã? –  perguntou ele meio sem graça, talvez por ter percebido que eu falava a verdade e não entendera ele como um desacato.
- Bem! – pensara ele por alguns segundos e então respondera: _Exatamente aconteceu comigo o que não deixarei acontecer com você.  – dissera ele convicto de suas palavras.
- E o que foi que aconteceu papai?
- Meu filho, quando eu tinha a sua idade, as meninas  faziam fila para estarem ao meu lado, todas queriam um pouco de atenção  e...
- E então porque foi que o senhor pegou a mamãe?
(Não entendi porque meu pai riu neste momento, e continuei prestando atenção no que ele tinha a me falar)
- Sua mãe foi muito bonita meu filho e......
- Ah, já entendi o que o senhor quer me falar, mamãe pensou que o senhor ia continuar a ser bonito inteligente e responsável e o senhor pensou que a mamãe iria continuar a ser bonita, por isso se casaram e agora conseguem enxergar que nada do que vocês pensaram é verdade?
- Naaaaaaão, Ernestinho, vê se cala tua matraca e deixa-me falar e...
(Será que eu estava enganado ou meu pai estava nervoso? Mas nervoso com o que?).
- Ernestinho, é o seguinte: O Senhor Cesar Cerqueira tem uma filha, segundo ele ela é linda de morrer, inteligente, estudiosa, caprichosa, talentosa e...
- Já entendi, o senhor não quer que eu olhe para ela, pois ela vai ficar que nem a mamãe, é isso`?
- Que é isso menino?  Fique sabendo que tua mãe é muito bonita, e......(meu pai deu um suspiro profundo como se tivesse relembrando o passado) ......o que eu quero dizer ( voltara ele a calma com a qual começara a tal da conversa que eu não estava entendendo nada) O que eu quero dizer é que você sendo bonito do jeito que é, e ela linda de morrer, quem sabe, se acaso você não venha a gostar dela, e quem sabe, podem se tornar amigos e você sabe como é, conversa aqui, conversa ali, risinho aqui , risinho acolá.......Meu filho, o que eu estou  te pedindo, da uma paqueradinha na menina e.......
- Ah! Agora entendi! – disse eu com um sorriso no rosto – O senhor quer que eu conquiste a menina para quem sabe um dia eu casar com ela e a fortuna do pai dela vir para mim, não é isso?
- Que é isso menino? Não é isso o que eu estou falando, o que eu estou falando é para você só ficar amigo da filha do Sr. Cesar e ele ver a boa educação que eu dou a você e se a filha dele quiser vir aqui, então o pai dela terá que vir também e ai quem sabe o papai sobe de cargo e...
- Já entendi papai, o senhor quer que eu namore a filha do senhor Cesar Cerqueira.
- Não precisa namorar meu filho, mas se você se tornar amigo dela... Você sabe família que luta junto, permanece unida.
Meu pai deixou um sorriso formar-se em sua boca e com um tom suave disse:
- Você é um Cabreira mesmo, Ernestinho! Mas não esqueça se faça de difícil, ok?
Para que o evento fosse perfeito, meu pai mandou Plinio, meu irmão caçula, para a casa da minha tia, pois ele não era flor que se cheirasse e poderia arruinar a sua noite.
Meu pai dera as seguintes recomendações a todos os presentes:

1-      A Cada toque do interfone deveria Brigite, nossa empregada que na verdade se chamava Severina, trazer o vinho que meu pai pagara uma nota, segundo ele, e servir o Sr. Cesar Cerqueira.  O primeiro toque, no entanto significava que Brigite deveria adentrar a sala e perguntar para o Sr. Cerqueira, bem como para o papai e a mamãe, o que ambos gostariam de beber.  (Meu pai comprara todo o tipo de bebida alcoólica e não alcoólica também). Minha mãe deveria entrar depois de um minuto que o Sr. Cerqueira já estivesse em casa.

2-      Minha mãe deveria levantar-se pelo menos duas vezes da mesa e seria acompanhada  do cavalheirismo de meu pai, que também se levantaria, num sinal de respeito.

3-      Minha mãe deveria fazer perguntas como : Querido, desculpe-me lhe perguntar, mas me veio agora a memoria, você chegou a telefonar para o Sr. Edir, ele me disse que durante horas tentara fazer contato consigo para saber o que ele deve fazer com os alqueires que ele comprara?

4-      Meu pai responderia  que já solucionara tal fato e minha mãe se desculparia pela importuna pergunta...

5-      Eu deveria puxar a cadeira para que a tal da filha do Sr. Cerqueira se sentasse.

6-      Brigite (Severina) deveria permanecer com o bico calado.

7-      Caso fosse à pergunta dirigida a mim o que eu queria ser quando crescesse, deveria eu responder que quero ser  médico.

8-      Caso o senhor Cerqueira perguntasse por que médico, então eu deveria formular minha resposta da seguinte maneira (recebi um texto de meu pai com tudo escrito que tive que decorar, e eu sempre fui bom em decorar):

_Essa é uma área que aguça minha curiosidade, Eu quero me aprofundar no estudo, me tornar um especialista. Eu acredito que o futuro de um homem está no exercer desta profissão. Eu acho que eu tenho talento para tal, já a alguns anos  faço algumas experiências, claro não muito severas, mas o suficiente para colocar em pratica essa minha aptidão.

9. Caso o senhor Cerqueira pergunte que tipo de experiências faço, devo dizer que:   Às vezes examino insetos, animais, sem machuca-los é claro, e as vezes tento diagnosticar em meus próprios amigos qual o problema que eles tem. Tudo em pró da medicina à de se entender.


A campainha tocou às 19 horas. Brigite (Severina) estava com tudo pronto, a comida estava no ponto para ser servida. Ela era a que estava mais afoita de todos nós. Minha mãe trajava um Kaftã dourado e meu pai de terno e gravata.  Papai abriu a porta. Eu, mamãe e Brigite, nos encontravam atrás da porta da cozinha. 
Esperamos ansiosos. Mamãe entrou em cena, agora restava eu e Brigite.
Esperei dois minutos e então entrei.
Meu olhar buscou a filha do senhor Cerqueira.
La estava ele! O senhor Cerqueira e... Meu Deus do Céu? – Meus olhos pareciam não acreditar no que eu via. A filha do Sr. Cerqueira?
- Olá meu jovem? – cumprimentou o patrão do meu pai.
Permaneci por alguns segundos completamente mudo, fixando o meu olhar na menina que estava a minha frente, ignorando a outra ao lado desta completamente.
- Ernestinho, meu filho! – dissera meu pai colocando a mão sobre meu ombro (de uma forma um tanto pesada) Diga olá para o Sr. Cerqueira, ele esta falando com você!
- Ora, Ora Cabreira, não vê que o seu filho tem olhos voltados a outros interesses?
 Eu não precisei olhar meu pai para saber que ele sabia o que eu pensava naquele momento.
- Oh o-o-olá, Sr. Cesar Cerqueira, eu sou o filho do meu pai e... quero dizer... eu me chamo Ernesto e, bem... essa que é a sua filha?
Percebi que ele me dera um sorrisinho amistoso
- Não, não, minha filha é esta aqui – dissera ele apontando a menina que estava ao lado da Deusa que eu tinha a minha frente. Meus olhos se desviaram lentamente, como se estivessem presos por um magnetismo poderoso.  E ai eu avistei a menina que o Sr. Cerqueira  indicava.
- Que Deus me perdoe! – disse eu em pensamento – Que, que é isso minha gente? Isso não é uma menina, isso é um Hipopótamo! A menina não era grande... Ela era gigante e enooooooooorme de gorda! O rosto dela parecia uma pizza-família. Só um braço dela era do tamanho da minha perna e... Eu não tinha palavras para descrever o que eu via... Eu olhei abismado para aquela garota tão gorda e desproporcional e então meus olhos se voltaram para a menina linda, de olhos castanhos e cabelos negros, figura de modelo de revista...
- Olá! Meu nome é Mariá, obrigada pelo convite que vocês fizeram ao meu pai.
Qual é o seu nome? – perguntei a beldade a minha frente ignorando novamente a outra moça.
- Penélope, mas pode me chamar de Pamy... todas as Cheerleaders (praticante de animação de torcida) me chamam de Pam...
- Pam......Muito bonito o seu nome!
Foi só eu elogiar e o peso do braço de meu pai se tornou maior e percebi que eu tinha que dizer algo para a tal da gordinha...
- E você, como é que você se chama?
- Mariá... eu já havia lhe dito! - disse ela ficando vermelha nas bochechonas.
-Prazer Maria. 
-Mariá! Não é tão difícil, você só tem que dizer Maria, mas acrescentar uma entonação na letra “a”.
- Ok, ok... Mari... aaa?
- Isso – respondera ela, ficando vermelha nas bochechonas novamente.
-Essa é minha filha! – dissera o pai todo orgulhoso.
Por tudo que eu poderia esperar na minha vida, jamais imaginei que a filha do Sr. Cerqueira  fosse tão......tão......como posso dizer? Imensa, enorme... Volumosa.
O Senhor Cerqueira  olhou meu pai e então me olhou:
- Uau! Seu filho é mesmo direto em Cabreira?
Tenho certeza que meu pai se sentiu fracassado, afinal, já a primeira regra eu falhara  eu olhara para a menina errada.
 No primeiro toque de interfone aparecera como combinado, Brigite que fora apresentada por meu pai. Minha mãe que já se encontrava na sala, pedira como bebida uma tônica, meu pai um Whisky puro, o Sr. Cerqueira uma pina colada, para mim e para Penélope fora servido limonada e para a Mariá fora servido......sei lá o que......
 

Nos sentamos a mesa para o jantar. Brigite serviu como entrada camarão  gratinado com empadinhas de camarão. O senhor Cerqueira parabenizou a entrada, Penélope deixou a massa da empadinha de lado e Mariá limpou o prato.
O prato principal fora servido  comida típica alemã, Joelho de porco com Knödel.....Sr. Cerqueira ficara admirado com a especialidade e Mariá foi a que mais elogiou.
Durante ao jantar foram debatidos vários temas até que eu ouvi quando meu pai falava sobre profissão, a  palavra chave fora mencionada:
- Meu filho deseja ser algo bem diferente de minha profissão!
- Eu sabia que eu estava no ar, assim sendo, me postei em minha cadeira e esperei até que meu pai me dirigisse à palavra:
Não foi ele que me dirigiu, mas sim o Sr. Cerqueira:
- E o que você deseja ser meu rapaz?
- Medico – disse eu prontamente
- Em qual área?(Opa, pensei eu – isso não fora decorado ...........Como foi o nome que o Antônio disse, Gení.....Gení.....cola .......gista? – Ok, mais ou menos isso, diga rápido e ninguém vai perceber a diferença, disse eu em pensamento.
- “Genicolagista”!
Um riso geral
- Meu filho e suas piadas.........- dissera meu pai avermelhado encarando a cara do sr. Cerqueira . Ambos sabiam que eu não sabia do que eu estava falando.
- ha, ha, ha, ha.........- rira Mariá – É um excelente trocadilho , na minha turma nos usamos também tal trocadilho.....Geni para Gine, cola para colo, gista para gista....Ginecologista.......muito boa , eu jamais imaginei que eu ouviria isto de você Ernesto?
- Ginecologista? – perguntei eu a mim mesmo? Estaria a menina com cara e corpo de hipopótamo me dando uma chance para eu não padecer em minha ignorância?
Seria possível que aqueles olhos amendoados, cheios de ternura estavam me dizendo , agarra essa explicação, pois esta é a tua salvação!
- Você sabe exatamente como eu sou papai, eu e minhas piadas.
O riso do Sr. Cerqueira se fez presente e Penélope então fez a pergunta:
- Ginecologista? Mas porque ginecologista?
- Deus do Céu!  Sei lá porque! – pensei comigo mesmo -  foi um amigo meu que disse que queria ser ser genicolagista,.......como é mesmo o nome? Ele disse que seu pai o era e ele queria ser igual ao seu pai, portanto, seja lá o que for, era ser medico especialista............mas a minha maior pergunta estava  em o  porque Penélope queria saber o porque, não poderia ela permanecer na minha explicação de ser medico e a área que eu queria atuar, ? Ok, vamos responder o que meu pai me fez decorar.
-Essa é uma área que aguça minha curiosidade, Eu quero me aprofundar no estudo, me tornar um especialista. Eu acredito que o futuro de um homem está no exercer desta profissão. Eu acho que eu tenho talento para tal, já a alguns anos  faço algumas experiências, claro não muito severas, mas o suficiente para colocar em pratica essa minha aptidão.
As vezes examino insetos, animais, sem machuca-los é claro, e as vezes tento diagnosticar em meus próprios amigos qual o problema que eles tem. Tudo em pró da medicina à de se entender.
- Em seus amigos? – perguntara Sr. Cerqueira
- Sim , claro, com a maioria deles........Eu diagonizo( como é que fala mesmo?) Dia.....
- Diagnóstico – disse Mariá.
É.....exatamente, dou o dia.....diagnostico
- Diagnóstico – repetira ela
- hahahahhahahahha- prestando atenção heim! Hahahahhahahahahha- “gordinha que sabe tudo!” Pensei eu .
- O que é um Geni.....o que faz  ....quero dizer ....eu não entendo...o que é um geni......ligista.- perguntara Penélope à mesa e por um momento não sei porque, todos se calaram mas Mariá tomou a palavra.
- Ginecologista ? Ah! Ernesto me permita esclarecer, por favor!
- Ok!... (pensei comigo, diga para que eu também fique informado e faca do teu talento o meu talento)
- A ginecologia literalmente significa "a ciência da mulher", mas na medicina é a especialidade que trata de doenças do sistema reprodutor feminino, útero, vagina e ovários.
Foi então que percebi que existia alguém mais forte à nossa mesa. Alguém mais bonita, alguém mais poderosa, alguém mais inteligente, alguém mais amiga, alguém mais gente, mais real, mais honesta, mais sincera, mais mulher... muito mais gorda.....esse alguém era Mariá
Passado o incidente, falamos de outras coisas...
Penélope me disse que o time de futebol........sei lá qual era o nome do time.....Seu pai era o.....Quem era o seu pai? ... Ela gostava de... Do que que ela gostava?.......
Voltando a Mariá!... (suspiro). Sim voltemos a ela. Mariá. Ela me disse que sabia que eu não sabia do que eu estava falando.
Dois dias depois nos encontramos a frente de um cinema e assistimos “Marcelino, pão e vinho”, uma reprise e choramos os dois. Tomamos sorvete, comemos pizza e eu levei uma paulada na cabeça de um bando de garotos por defender Mariá, que a chamaram de “gordona. Fui internado, meu pai promovido. Mariá e eu éramos amigos. Trocávamos segredos, sentimentos, conversávamos e riamos muito, mas na hora do choro, estávamos sempre presente um para o outro. Mariá se tornou tudo para mim. Eu a amei mais do que a mim mesmo. Certo dia o telefone de casa tocou... Era o Sr. Cerqueira. No dia seguinte estávamos a rezar o pai nosso e a jogar terra no túmulo de Mariá. Ela se foi e a comedia de tudo isso é que eu entendi o que significa ser belo... É ver o que os olhos não veem , mas sim o que o coração sente. Eu te amo Mariá.

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